De frente com o...

30.12.19



Fechei os olhos, só havia escuridão.

Quando os abri, procurei pela luz do dia, mas tudo continuava igual. Eu estava imersa naquele breu infinito por mais que eu tentasse procurar um mínimo raio de sol e, às vezes, eu podia ver algo, as sombras borradas das pessoas, casas e carros que entravam na minha frente em um breu mais profundo.

Eu estava indo na direção contrária, mas por quê?

Por que eu estava na escuridão lutando contra a corrente natural da vida?

É fácil, dizia a minha mente, você deve fazer tudo de maneira natural, seguir a linha da vida, estudar, se formar, trabalhar, casar, ter filhos... É uma receita que todos estão seguindo, é fácil, deixa de frescura.

Respirei fundo, mas algo estava errado dentro de mim. Virei as costas e caminhei junto com eles, mas a escuridão se tornou completa.

Era difícil caminhar, meus pés se afundavam em uma areia movediça que me puxava para baixo, mas eu não conseguia vê-la.

Pessoas passavam ao meu redor ignorando o fato de eu estar lutando contra aquilo que me puxava para baixo, sorrisos falsos e olhares vazios estavam estampados em seus rostos. Não passavam de máscaras sem cor.

Estiquei meus braços, quase em câmera lenta pelo ar. Procurando por algo em que pudesse me agarrar, mas não havia nada que me trouxesse de volta para a superfície.

As pessoas continuavam a caminhar ao meu lado, quase pisando no meu corpo, sem importar em deixar suas pegadas em mim. O asfalto áspero sobre o qual eu apoiava o rosto me machucava como uma carícia masoquista. 

A dor significava que eu estava crescendo, certo? Amadurecendo.

Um vagalume passou no meio da escuridão, movi minhas pernas dentro da areia movediça e apoiei as mãos sobre o asfalto cortante, saí daquele buraco, com a roupa pesada pela areia molhada que fazia peso sobre minhas pernas quase imóveis.

Corri o mais rápido que pude para alcançá-lo, empurrei pessoas que se colocavam no meu caminho e gritei escutando o eco da minha voz ressoar nos corpos sem vida. Continuei correndo atrás do vagalume, até que ele parou e eu finalmente pude tocá-lo.

Um clarão iluminou tudo ao meu redor, a luz era tão forte que eu não podia manter os meus olhos abertos, os fechei novamente com medo de voltar à escuridão, mas quando eu os abri, não havia nada ao meu redor, somente areia aos meus pés e um céu azul. Pensei ter visto uma pessoa no horizonte, caminhei sentindo o cheiro salgado de um mar que eu não podia ver.

Logo, encontrei a pessoa que havia visto. Era meu reflexo em um espelho grande e enferrujado. Eu vestia um longo vestido branco que voava com o vento, a beleza daquela cena se desvanecia ao encarar meu rosto cansado e as olheiras tão profundas quanto a noite. Atrás do meu reflexo, a escuridão se aproximava em uma nuvem negra que queria me envolver a todo custo.

Olhei para trás, estava de frente com os meus medos. Voltei a olhar o meu reflexo no espelho velho e, logo, olhei para além dele, um céu azul com gaivotas e um mar transparente. Ali, parada, eu estava de frente com o meu futuro.



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